segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Um salto 13 e, finalmente, uma dose de mim, por favor!

Minha infância foi regada de muita CarlaPerez, muito "segura o tchan, amarra o tchan, segura o tchan, tchan, tchan, tchan, tchan" e essas coisas. Não sei ao certo que idade eu tinha quando ganhei meu primeiro tamanco assinado pela loira bunduda que era a inspiração da minha pouca idade, o que eu sei é que aqueles saltinhos de nada, mais o fato de ter um salto nos pés do que o salto em si, fizeram eu me sentir mais mulher. Ou menos pirralha. Não foram poucas as noites que reunia todo mundo na sala, botava meu menor short, as luvas até o cutuvelo que vieram junto com a boneca que era do meu tamanho e fazia todos passarem looongas horas me vendo dançar "igualzinho a Carla Perez". Uma vez meu pai querendo dar exemplo de como era importante estudar me mostrou algo na televisão e eu disse que não corria risco daquilo acontecer comigo, afinal de contas, se tudo desse errado, eu sabia rebolar igualzinho aquela gostosona e ainda por cima de salto alto! Também não foram raras as tardes que me infurnava no armário da minha mãe e saia martelando o chão de casa com aqueles saltos enormes dela. Sonhava com o dia que poderia ter tantos sapatos altos como a minha mãe tinha. Cresci e na flor dos doze anos (com cara de quinze) era a rainha do salto alto. Nas já primeiras festinhas pré-adolescentes onde quase todas as garotas ainda usavam suas sandalhas da Sandy, lá estava eu arrasando no salto de madeira, de cerâmica, de qualquer coisa, desde que fosse alto. Não que minha mãe fosse uma sem noção que deixa a filha sair igual uma maluca de novela pela rua, claro que não, muito pelo contrário. Minha mãe e todo mundo tinha plena consciência de que A) meu gênio leonino não me deixaria por nada ceder aos apelos de todos, uma vez que, eu com meu corpo super-desenvolvido pela puberdade, eu tinha tamanho/curvas o suficiente pra bancar aquele tipo de sapato. B) não é que eu ficava bem naquele negócio? O tempo foi passando, as que antes me invejavam, porque a mãe não deixava usar nem plataforma, foram ganhando os primeiros saltos 4 e eu lá, no topo do mundo. Até que conheci e fiquei com ele. No começo eu abusei mais ainda dos meus bons e velhos companheiros. Acreditava que ficava mais bonita com eles, mas no fundo só me sentia mais dona do mundo. No nosso primeiro beijo, eu tava com o sapato que eu mais gostava. E ele era bem alto. Porém a vontade de só ficar do inicio, virou um encantamento absurdo. De repente, eu não queria mais ser a mulher-fatal-que-passa-e-deixa-todo-mundo-babando, eu só queria ser a mulher feita pra ele. Entende a diferença entre mulher suficiente pra ser dele e mulher feita exatamente pra ele? Eu queria que ele me olhasse e pensasse "essa foi feita sob medida pra mim". E vamos combinar, o garoto que olha pra uma menina com dois metros de perna, numa mini-saia e o cabelo arrastando na cintura não, exatamente, pensa que ela vai ser a mãe dos seus filhos. Então, veio a grande tranformação. Enquanto as outras iam cada vez mais pras alturas, eu desci e assumi meus humildes 1,57m. Mas assumi também, aos poucos, o posto de namorada do gato da escola. Percebi que ainda que meu posto de gostosona tivesse sido tomado pelas minhas amigas usei-sandalha-da-Sandy-até-a-sexta-série, eu era a feliz do grupo. E durante anos eu fui mesmo. Só que tudo na vida acaba. O mar de rosas virou um mar numa puta de uma ressaca e ai então...secou. Juntei s pedaços de mim com o resto de dignidade que me restava, e empinando o nariz mais do que sempre, pra parecer mais gente do que uma simples garotinha de rasteirinha e calça jeans, pulei fora. Logo na primeira night veio o susto, eu tinha desacostumado a ser a garota-fatal. Uma sensalçao gigante de que eu não deveria estar ali, em cima daquele salto bizarro, naquele lugar cheio de fumaça e gente feliz, me invadiu. Mas ela só ficou em mim tempo suficiente pro meu cérebro resgatar memórias que o namoro longo tinha excluído de mim. Eu era aquela. Não a louca que sobe em mesas e toma porres apavorantes, não a namorada submissa que se esconde atras do namorado e vive a vida dele até ser dipensada e virar a melo-dramática que se tranca no quarto e chora até ter crise de asma e parar no hospital, não a esculhambada que vai pra qualquer lugar de all star e não vê problemas nisso. Eu sou uma garota que tem dentro de si vários jeitos, várias personalidades. E enquanto, no dia seguinte, eu entrava na terceira loja em busca do quinto par de saltos, eu soube: a maior herança de um grande amor que acaba é sempre aprender mais um pouco sobre você mesmo. E claro, aconteça o que for e seja por quem for, nunca deixe de lado o seu salto alto, ou qualquer que seja a coisa que te faça se sentir bem. Nada ameniza a sensação de estar perdida em um mundo que sempre foi o seu.

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